segunda-feira, 20 de junho de 2016

Quando os filhos voam

Texto simplesmente perfeito do Rubem Alves...chorei e choro toda vez que leio, porque o verdadeiro amor é isso aí mesmo:

"Sei que é inevitável e bom que os filhos deixem de ser crianças e abandonem a proteção do ninho.
Eu mesmo sempre os empurrei para fora.

Sei que é inevitável que eles voem em todas as direções como andorinhas adoidadas.

Sei que é inevitável que eles construam seus próprios ninhos e eu fique como o ninho abandonado no alto da palmeira…Mas, o que eu queria, mesmo, era poder fazê-los de novo dormir no meu colo…

Existem muitos jeitos de voar. 
Até mesmo o vôo dos filhos ocorre por etapas. 

O desmame, os primeiros passos, o primeiro dia na escola, a primeira dormida fora de casa, a primeira viagem…

Desde o nascimento de nossos filhos temos a oportunidade de aprender sobre esse estranho movimento de ir e vir, segurar e soltar, acolher e libertar. 

Nem sempre percebemos que esses momentos tão singelos são pequenos ensinamentos sobre o exercício da liberdade.

Mas chega um momento em que a realidade bate à porta e escancara novas verdades difíceis de encarar. 

É o grito da independência, a força da vida em movimento, o poder do tempo que tudo transforma.

É quando nos damos conta de que nossos filhos cresceram e apesar de insistirmos em ocupar o lugar de destaque, eles sentem urgência de conquistar o mundo longe de nós.

É chegado então o tempo de recolher nossas asas. 

Aprender a abraçar à distância, comemorar vitórias das quais não participamos diretamente, apoiar decisões que caminham para longe.

Isso é amor.

Muitas vezes, confundimos amor com dependência. 
Sentimos erroneamente que se nossos filhos voarem livres não nos amarão mais. 

Criamos situações desnecessárias para mostrar o quanto somos imprescindíveis. 
Fazemos questão de apontar alguma situação que demande um conselho ou uma orientação nossa, porque no fundo o que precisamos é sentir que ainda somos amados.

Muitas vezes confundimos amor com segurança. 
Por excesso de zelo ou proteção cortamos as asas de nossos filhos.
Impedimos que eles busquem respostas próprias e vivam seus sonhos em vez dos nossos.

Temos tanta certeza de que sabemos mais do que eles, que o porto seguro vira uma âncora que impede-os de navegar nas ondas de seu próprio destino.

Muitas vezes confundimos amor com apego.
Ansiamos por congelar o tempo que tudo transforma. 
Ficamos grudados no medo de perder, evitando assim o fluxo natural da vida. 
Respiramos menos, pois não cabem em nosso corpo os ventos da mudança.

Aprendo que o amor nada tem a ver com apego, segurança ou dependência, embora tantas vezes eu me confunda. 

Não adianta querer que seja diferente: o amor é alado.

Aprendo que a vida é feita de constantes mortes cotidianas, lambuzadas de sabor doce e amargo. 

Cada fim venta um começo.
Cada ponto final abre espaço para uma nova frase.

Aprendo que tudo passa, menos o movimento. 
É nele que podemos pousar nosso descanso e nossa fé, porque ele é eterno.

Aprendo que existe uma criança em mim que ao ver meus filhos crescidos, se assusta por não saber o que fazer.

Mas é muito melhor ser livre do que imprescindível.

Aprendo que é preciso ter coragem para voar e deixar voar.
E não há estrada mais bela do que essa."

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